quarta-feira, 28 de fevereiro de 2018

Família Real Portuguesa na Procissão do Senhor dos Passos da Graça



A Família Real Portuguesa esteve presente na secular Procissão do Senhor dos Passos da Graça, cumprindo a tradição, que se realizou em Lisboa.










terça-feira, 27 de fevereiro de 2018

Eutanásia: uma falsa compaixão

Todos sabemos que a vida não nos pertence por completo: foi-nos dada pelos nossos pais como um dom, pelo que não temos domínio absoluto sobre ela. E este ponto reforça os argumentos contra a eutanásia


Falar de Eutanásia, na minha opinião, só será possível se destacarmos a dignidade do ser humano. Por isso, ser de direita ou esquerda, religioso ou agnóstico, não me parece que seja o ponto de partida mais relevante, nesta discussão sobre a legalização da Eutanásia.
Ao longo dos tempos, a palavra teve vários significados e por vezes diferentes. Etimologicamente, Eutanásia (do grego “eu”, bem, “thánatos”, morte) não significa outra coisa que uma “boa morte” ou “bem morrer”. Hoje, a Eutanásia ganhou o sentido de homicídio a pedido e por compaixão, isto é, o de causar, de forma activa, a morte de outra pessoa, por piedade perante o seu sofrimento e atendendo ao seu desejo de morrer. Por isso, segundo a interpretação que se vai dar ao termo Eutanásia, a sua prática tanto pode significar um crime desumano, como um aparente acto de misericórdia solidária. Também é verdade que todos aqueles que aceitam que deverá existir legislação sobre a Eutanásia como algo mais inócuo do que aquilo que realmente é, se posicionam do lado desta última interpretação, afirmando que se trata de uma “morte doce “ou “morte digna” e, com isso, procuram a sua aceitação social (e, de certa forma, uma validação moral).
Independentemente das interpretações, a sua prática implica provocar directamente a morte, através de procedimentos baseados na medicina (não são procedimentos ou actos médicos, pois estes têm como pressuposto cuidar da saúde e da vida!) a doentes terminais para evitar o seu sofrimento e aliviar a carga que incumbe aos familiares mais próximos.
Existe uma tendência para escrever nos meios de comunicação social sobre as vantagens de aceitar a moralidade da Eutanásia, num esforço de conquistar mais público para a sua legalização. Também existem alguns parlamentos nacionais, em poucos países, onde os deputados tentam também eles conseguir aprovar a legalização desta prática. Convirá aqui lembrar que no parlamento do Reino Unido este debate já se fez por duas vezes e a lei pró-eutanásia foi chumbada.
Mas aplicar a morte por Eutanásia não é da competência do médico. Assistir ao suicídio não é consistente com o compromisso que o médico fez de tratar da doença conforme o código tradicional da ética médica constante do juramento de Hipócrates e que se mantém actual. Se aceitássemos isto, haveria uma desconfiança das pessoas em relação aos médicos e, por isso, os médicos e os enfermeiros não podem ser coagidos na sua ética, e não devem ser pressionados para actuar contra os seus verdadeiros valores profissionais. Os médicos existem para aliviar o sofrimento e não para matar! Se atribuirmos aos médicos o poder de praticar a Eutanásia, eles deixarão de ser uma referência confiável e muitas dúvidas surgirão sobre o verdadeiro âmbito da relação médico-doente.
A vida humana tem um valor intrínseco em si mesma. A boa saúde não pode dotar de dignidade a vida humana, pois a saúde não tem valor em si mesma, mas antes participa da vida. Obviamente que a saúde é algo de que se deve tratar e cuidar, mas não é um bem absoluto ao qual tudo se deva subordinar. A saúde é para o ser humano, e não o ser humano para a saúde. A dignidade da pessoa que não desaparece com a doença, nem a eutanásia confere dignidade, por si só, à morte. Todos os doentes nos ensinam, nomeadamente os doentes crónicos, que a saúde não é um valor absoluto.
Uma parte do problema neste debate sobre a Eutanásia está em que não se dá nenhum valor ao sofrimento, porque muitas das vezes este sofrimento, se devidamente apoiado, é uma ocasião para que a pessoa aprofunde a sua própria existência, se reconcilie e encontre um sentido transcendente para a sua vida. Quem, infelizmente, teve de passar por isso, dá testemunho desta verdade. Dizer isto não significa de forma alguma que se ache aceitável nos dias de hoje um sofrimento que se torna destrutivo ou insuportável, quando existem meios clínicos disponíveis para intervir activamente nesse sofrimento, nomeadamente em fim de vida, com os cuidados paliativos.
Porém, vivemos um tempo em que tudo se relativiza, e a dor e o sofrimento são descartáveis, algo de que é melhor não falar e que não é conveniente. O ser humano hoje tem muita pouca tolerância perante a dor, teme o seu sofrimento. Esse temor, legítimo, deve-se principalmente a uma preocupação excessiva com o corpo, esquecendo-se que as mulheres e os homens são também seres espirituais e podem transformar e encontrar sentido nas contrariedades da vida. E por isso este processo contemporâneo de não-aceitação do sofrimento, enquanto experiencia de quem está vivo e faz escolhas, está a resultar em que a sociedade venha também a procurar a Eutanásia.
Todos nós sabemos que a vida não nos pertence por completo. A vida foi-nos dada pelos nossos pais como um dom, e por isso não temos domínio absoluto sobre ela. E este argumento reforça todos os argumentos críticos contra a Eutanásia, pois a qualidade de vida, sendo uma dimensão importante da mesma mas não a única, não pode ter maior valor que a própria vida. A autonomia do doente não deverá ser condicionada pela própria vida, isto é, não poderá ser um absoluto no que se refere à sua própria vida. Por isso, a verdadeira compaixão não consiste em ajudar a eliminar a pessoa que sofre, mas sim em acompanhar e ajudar a intervir activamente no seu sofrimento, reduzindo-o para níveis toleráveis.
O que nunca deve faltar é o tratamento paliativo para diminuir o sofrimento. O doente incurável tem a mesmíssima dignidade de qualquer ser humano não doente e por isso causar-lhe a morte é um crime, mesmo que isso se faça por alegada compaixão.
Não é um suicídio assistido que ajuda as pessoas a morrer dignamente. A verdadeira morte digna acontece no ocaso de uma vida digna e é proporcionada sem dúvida nenhuma por quem se aproxima do doente terminal disposto a acompanhá-lo, e com solidariedade, ciência rigorosa e verdadeira compaixão se entrega ao seu cuidado.
E aquilo que vemos são alguns que se posicionam como supostos defensores dos direitos humanos a propor a legalização da Eutanásia, em sentido totalmente inverso ao principal direito de todos os Homens: o direito à protecção da vida. Esperemos que os legisladores actuem com sensatez, sabendo que o homem de hoje tem muitas dificuldades em enfrentar a dor, o sofrimento e a morte, mas aceitando sempre defender a vida que é em todas as situações humana, valiosa e digna.


Fonte: Observador

segunda-feira, 26 de fevereiro de 2018

Aqui repousa o nosso Apóstolo do Oriente

Foto de Nova Portugalidade.


A igreja privativa da Casa Professa foi começada a construir em 24 de Novembro de 1594, à custa dos legados do capitão de Ormuz e Cochim, D. Jerónimo de Mascarenhas, sendo sagrada pelo arcebispo D. frei Aleixo de Meneses, em Maio de 1605. Quando das festividades por ocasião de São Francisco Xavier, em 1624, o templo estava praticamente acabado e a sua decoração interna também a ponto de receber com pompa o novo sarcófago do Apóstolo das Índias.

A capela de São Francisco Xavier, onde se expõe o seu sumptuoso túmulo, foi concluída em 1659, posto que tenha continuado a ser enriquecida, durante as décadas seguintes. A sua estrutura é muito original, pois abre-se para os quatro lados através de grandes portais; um para o transepto, outros dois para a zona da ante-sacristia e finalmente outro para o claustro. Se é assim no piso térreo, igualmente há acesso à sua vista superior através de varandas, uma das quais fica junto à passagem para o coro-alto.
As paredes são integralmente forradas com talha dourada de fabrico local, onde se incluiram quadros alusivos à vida de São Francisco Xavier, uns de clara origem italiana e outros fruto do engenho de pintores goeses.

A obra mais importante da ourivesaria indo-portuguesa é a caixa de prata deste monumento funerário, aqui numa foto anterior às modificações feitas em 1951. Foi executada em Goa, em 1637, e é claramente obra de artistas indianos, cristãos ou não. Atingiu o preço de 12.000 escudos, e os trinta e dois quadros em prata que o adornam basearam-se, no todo ou em parte, em gravuras do francês Valerien Régnar, impressas em Roma, em 1622, que reproduzem as pinturas de grande dimensão que, durante as festas da canonização cobriram as paredes laterais da igreja de Jesus de Roma, que por sua vez foram inspiradas nos dados relatados na História da Vida de São Francisco Xavier de João de Lucena, de 1600, impressa em Lisboa, e na De Vita B. Francisci Xaveri J., de Orazio Tursellino, publicada em Lion, em 1604. Este conjunto é o mais extenso ciclo hagiográfico xaveriano, com maior número de ícones.
A base do monumento funerário propriamente dito foi oferecido pelo grão-duque da Toscana, Cosimo III de Medice. Já o sarcófago de prata é uma obra indo-portuguesa, executado em Goa, nos anos de 1636 e 1637. Quanto ao soco, só depois do padre Francisco Sarmento ter dado um cochim que estivera sob a cabeça de São Francisco Xavier ao grão-duque, é que este decidiu oferecê-lo, encomendando-o a alguns dos melhores e mais conceituados artistas italianos do tempo.

É composto por um maciço de mármore, paralelipipédico, assente sobre outro mais largo, mas mais baixo, cuja ligação é feita por um ressalto, para melhorar a perspectiva. Este pódio inferior tem mármores amarelos-terra, vermelhos, na parte estrutural, e possui composições em mármore branco de Carrara nas quatro faces, de desenho complexo, com enrolamentos fitomórficos, tudo a enquadrar um escudo à italiana de fantasia.

O segundo nível, paralelipipédico, é feito em mármore azul levemente acinzentado, e cada face tem uma composição constituída por pilastras laterais muito largas, ornadas jarras com flores, e no meio de cada par há quatro belíssimos baixos-relevos em bronze. No primeiro pode ver-se São Francisco Xavier a pregar a nativos das Molucas. Por cima, dois anjos em mármore branquíssimo e de um irreprensível lançamento barroco, seguram um rótulo com enrolamentos vegetais e filactérias, onde se lê: “Nox inimiga fugat”. No segundo baixo relevo, o santo está a baptizar habitantes dessas mesmas ilhas e no conjunto superior, em tudo idêntico aos restantes três, o primeiro dos quais acabámos de descrever, está escrito na filactéria “Ut vitam habeant”. No terceiro relevo a cena é mais dramática, com Xavier a ser atacado por indígenas de Moro, com setas e pedras, e o missionário tenta escapar, atravessando um rio. A legenda superior é a seguinte; “Nihil horum vereor”. Finalmente, a quarta e última evoca a morte de Xavier na Ilha de Sanchoão, enquanto os seus companheiros e um anjo o assistem nesse transe. A legenda é “Major in Occasu”.
As pedras já lavradas, os relevos e demais materiais para o túmulo chegaram a Goa, em Setembro de 1698, levados por Placido Francesco Ramponi, o artista que foi encarregado da sua montagem. A execução propriamente dita, o trabalho de projecto, modelagem e escultura, no entanto, foi da responsabilidade do escultor florentino Giovanni Baptista Foggini. Se é verdade que Ramponi, que escreveu um tão detalhado diário da sua viagem, aliás ilustrado com magníficos desenhos e importantíssimos apontamentos sobre a região, nomeadamente sobre a Botânica, não nos legou a identidade do autor. Porém, no Abecedario Pittorico, publicado em Veneza, em 1753, lê-se que Giovanni Battista Goggini fez várias estátuas que foram dadas ao rei de França Luís XIV, como “…alcuni bassi rilievi, e puttini di marmo, per il Deposito de S. Francesco Saverio in Goa…”. Este artista foi nem mais nem menos do que “architetto primario e primo scultore della Casa Serenissima”, e também “soprintendente dei lavori”, entre 1687 e 1725. Em 1687, adquiriu a fundição que pertencera a Giambologna, situada no Borgo Pinti, o que lhe permitiu executar belíssimos relevos em bronze, como os quatro do monumento de São Francisco Xavier, ou os do túmulo de Galileo Galilei e do altar da capela Corsini, situada dentro da basílica de Santa Maria del Carmine, em Oltranto.

Pedro Dias, Professor Catedrático da Universidade de Coimbra

Foto de Nova Portugalidade.


domingo, 25 de fevereiro de 2018

O deputado e o Cardeal

Em Portugal, não é precisa nenhuma coragem para se ‘assumir’. Mas é necessário muito valor para alguém se afirmar católico, sobretudo se for fiel ao magistério e à tradição da Igreja.

Por razões diametralmente opostas, duas personalidades foram agora objecto de campanhas mediáticas contraditórias: enquanto um deputado foi louvado em tudo o que é sítio; o Cardeal Patriarca de Lisboa e Presidente da Conferência Episcopal Portuguesa, foi brutalmente enxovalhado, como talvez há muito já ninguém era tão maltratado publicamente.
Adolfo Mesquita Nunes é um jovem e promissor deputado, cujas intervenções públicas são, por regra, muito pertinentes. Graças à sua boa preparação e grande capacidade de argumentação, leva sempre a melhor nos seus confrontos com a bloquista Mortágua. Apesar de apreciar o seu trabalho, não li a sua entrevista de vida, pelo que só tardiamente me dei conta de que se tinha ‘assumido’, como agora se diz. Foi quando vi tão inflamados elogios à sua ‘coragem’ que percebi que tinha ‘saído do armário’.
Não tenho nada contra as suas opções ou tendências pessoais, que obviamente respeito, mas acho muito infelizes este tipo de confissões públicas. Mesmo que não tenha sido por sua iniciativa, foi certamente por sua livre vontade que referiu essas circunstâncias, que sobram numa entrevista que deveria ser exclusivamente política.
Não imagino Winston Churchill, que era um grande senhor da política e não só, a fazer revelações sobre a sua vida íntima, nem sequer a pedido de nenhum jornalista. No extremo oposto, também Álvaro Cunhal era muito reservado sobre a sua vida privada e, quando entrevistado, nunca descia a pormenores sobre a sua intimidade, fazendo-se assim respeitar pelo público em geral.
Não percebo, aliás, onde está a tão apregoada ‘coragem’ do agora assumido político que, a bem dizer, não correu nenhum risco com esta sua declaração. Na verdade, por tê-la feito, foi posto fora de casa?! Não consta. Foi despedido? Também não parece. Foi de algum modo ostracizado, ou prejudicado no seu partido, supostamente democrata-cristão?! Ao invés, esta sua declaração até o favoreceu politicamente! Foi criticado pela imprensa ou nas redes sociais?! Pelo contrário: todos o elogiaram! Afinal, onde está então a sua coragem?!
Se o ilustre deputado quer ser corajoso, sugiro que faça essas mesmas declarações na Arábia Saudita, na Rússia, no Iraque, ou no Afeganistão. Aí sim, é preciso coragem para tomar uma atitude dessas. Ou então, se quiser ser herói cá na terrinha, declare que é católico coerente e que, portanto, vive a abstinência sexual. Seria, pela certa, martirizado pela imprensa, como foi o Patriarca de Lisboa quando, entre outras, sugeriu essa atitude aos ‘recasados’ católicos.
D. Manuel Clemente não supunha, nem ninguém imaginava, o burburinho que as suas inócuas declarações provocariam na imprensa e nas redes sociais, até por se tratar, afinal, de uma questão interna da própria Igreja, que apenas respeita aos católicos. Contudo, como a matéria é sensível – o sacrossanto sexo! – o estrondo foi imenso e não faltaram fariseus a rasgar publicamente as suas vestes.
Só no Público, por exemplo, David Dinis escreveu um editorial sobre “Os três ‘pecados’ de D. Manuel Clemente”; João Miguel Tavares, que nestas questões é sempre muito politicamente correcto, perguntou acintosamente “Porque insiste a Igreja em meter-se na nossa cama?”; e Vicente Jorge Silva, em “Que aconteceu a D. Manuel Clemente?”, não só o acusa do “pecado da inclemência” e “da falta de lucidez mais rudimentar”, como lamenta que “um intelectual e homem de cultura de méritos reconhecidos” tenha sofrido uma “regressão tão aparatosa de raciocínio e sentido do real”! Tudo isto porque o Patriarca de Lisboa teve a ousadia de se dirigir aos seus fiéis, sobre uma matéria da sua competência pastoral, dando instruções que se limitam a reproduzir o magistério do Papa Francisco!
“Falando no celibato, o Patriarca de Lisboa meteu-se na cama”, segundo o director do Público. Ou seja: um deputado pode expressar publicamente as suas preferências em termos sentimentais, mas o Patriarca de Lisboa não pode explicar aos seus fiéis ‘recasados’ como devem viver, nas suas circunstâncias, a moral da Igreja a que pertencem e cujos ensinamentos querem seguir. Se um deputado fala sobre a sua sexualidade, faz muito bem e é até muito corajoso. Se o Patriarca fala, aos seus fiéis, sobre a sexualidade cristã, faz muito mal porque está a meter-se onde não deve e a ofender, com o seu anacrónico convite à abstinência sexual, todos os casais de católicos ‘recasados’!
Hoje em dia, em Portugal, não é necessária nenhuma coragem para se ‘assumir’ uma tendência mais ou menos alternativa. Quem se ‘assume’, como foi agora o caso, sabe que tem toda a imprensa a seu favor, as redes sociais do seu lado, os lóbis a protegê-lo, os interesses económicos a abençoá-lo e uma brilhante carreira política à sua frente.
Coragem é necessária, pelo contrário, para alguém se afirmar católico, sobretudo se for coerente, ou seja, fiel ao magistério e à tradição da Igreja. Coragem teve D. Manuel Clemente, em recordar os ensinamentos do Papa Francisco. Coragem teve o Patriarca de Lisboa ao falar de abstinência sexual, não como norma imposta a todos ‘recasados’, mas como mais uma proposta para o seu itinerário de conversão ao Evangelho. Coragem têm os católicos ‘recasados’ que a vivem. Coragem têm os que optaram pelo celibato, ou pelo casamento, e cumprem a sua promessa. Coragem têm os católicos cujo casamento fracassou e se mantêm fiéis a esse compromisso, que honram com a sua continência. Coragem têm os fiéis e pastores que, quando o seu bispo é atacado, o apoiam e defendem, mesmo quando outros, quais Judas, fazem coro com os inimigos de Cristo e da sua Igreja.
“Muitos – escreveu São Paulo aos filipenses – de quem muitas vezes vos falei e também agora falo com lágrimas, procedem como inimigos da cruz de Cristo: o seu deus é o ventre e fazem consistir a sua glória naquilo que é a sua vergonha” (Fil 3, 18-19). Que diria hoje o apóstolo daqueles cujo deus não é o ventre, mas o sexo?
Fonte: Observador

sábado, 24 de fevereiro de 2018

SAR, O Senhor D. Duarte de Bragança presente na conferência da Nova Portugalidade

Foto de Nova Portugalidade.


Presidida por SAR, o Príncipe da Portugalidade, excepcional conferência do Professor Pedro Dias promovida pela NP sobre Malaca Portuguesa de Ontem e de Hoje. Momento alto de cultura e patriotismo que terminou em demorada ovação ao insigne catedrático.

Foto de Nova Portugalidade.


Foto de Nova Portugalidade.


Foto de Nova Portugalidade.


Foto de Nova Portugalidade.


Foto de Nova Portugalidade.


Foto de Nova Portugalidade.


sexta-feira, 23 de fevereiro de 2018

A Última Morada dos Mártires Reais



A 10 de Fevereiro de 1908, após dois dias em que o Povo se despediu do seu Rei e do seu Príncipe Real, as urnas dos dois Mártires Reais são depositadas no Panteão Real ou Panteão dos Bragança da Igreja de São Vicente de Fora.
Os Mártires haviam sido ceifados à vida pelos execráveis actos dos terroristas da Carbonária sob mando de uma comissão revolucionária republicana, que, nesse infernal dia 1 de Fevereiro de 1908, colocaram extemporaneamente fim às existências d’ El-Rei o Senhor Dom Carlos I de 44 anos e do Príncipe Real Dom Luís Filipe de 20 anos.
Na antevéspera, num Sábado que nascera triste e enlutado, a 8 de Fevereiro de 1908, as urnas com os corpos embalsamados dos martirizados no Regicídio deixavam de ser velados na Capela do Palácio das Necessidades – onde repousavam desde 6 desse mês – e eram transferidos para o Mosteiro de São Vicente de Fora dando-se inicio aos Funerais de Estado.
O Cortejo fúnebre partiria do Palácio das Necessidades onde os corpos foram embalsamados de 2 para 3 de Fevereiro e onde foram velados até dia 8.
Eram 11 horas, naquela manhã lúgubre, quando as urnas soldadas, por onde, através dos tampos de cristal, se vislumbravam os corpos embalsamados dos Mártires Reais, foram depositadas sobre os coches que encimariam o Cortejo fúnebre. Completava o cenário de dor, um rufar lúgubre de tambores e sinos que choravam plangentes. As urnas foram cobertas por enormes mantos de veludo negro encimados por cruzes bordadas. Ao som das canhoadas das fortalezas e dos navios fundeados no Tejo, inicia-se o Cortejo com os coches tirados por 4 cavalos gualdrapados de um luto muito negro. Precedendo os coches seguiam seis Archeiros do Real Corpo de Archeiros, com as suas alabardas invertidas, em sinal de luto.
O 9.º Conde da Asseca transportava nas mãos a Espada do Príncipe Real e D. Fernando de Serpa a Espada D’el-Rei. O elmo D’El-Rei transportava-o o Coronel Charters de Azevedo; a Cazspka do Príncipe Real – famoso elmo dos Lanceiros – que Dom Luís Filipe usava enquanto Tenente Porta-Estandarte do mítico Regimento de Cavalaria nº 2, Esquadrão de Lanceiros n.º 2 d’El-Rei, era transportada pelo Marquês do Lavradio. Os fiéis de sempre eram seguidos pelos Cavalos enlutados do Rei e do Príncipe Real, o Júpiter e o Burster, que seguiam lado a lado com o Marquês do Faial, na qualidade de Estribeiro-Mor, e a escolta de Cavalaria comandada, pelo não menos dedicado, General Craveiro Lopes.
Seguiam dolorosos, no Coche Real, o enlutado El-Rei Dom Manuel II, ainda de braço enfaixado – resultado do ferimento sofrido no atentado perpetrado pela Carbonária a mando da comissão revolucionar ia republicana –  envergando pela primeira vez o Grande Uniforme de Marechal-General – privatístico do Rei –, talhado sob o de Seu Pai, e a Rainha-viúva Dona Amelia. Depois, de semblante muito triste e carregado, o Infante Dom Afonso Henriques de Bragança.
Ainda completavam o Cortejo de 200 carruagens, o Príncipe Arthur, Duque de Connaught, em representação de seu irmão, Eduardo VII da Grã-Bretanha, ambos primos de D. Carlos e depois os áulicos e restante Nobreza, representantes diplomáticos e autoridades.
O Cortejo seguiu serpenteando por Lisboa: Av.24 de Julho, Cais do Sodré, Terreiro do Paço Cortejo, Terreiro do Paço, Terreiro do Trigo, Alfama, Campo de Santa Clara e desembocou em São Vicente de Fora. O Povo assistia pesaroso!
Defronte à Igreja as urnas foram retiradas dos Coches e passados por um encadeamento de braços de funcionários da Casa Civil do Paço.
Colocadas as urnas na Capela-Mor, após as cerimónias fúnebres e a Missa de Requiem e antes de serem colocados no Panteão Real dos Bragança os féretros ficariam expostos durante dois dias na Igreja de São Vicente para serem homenageados, por centenas de milhares de Portugueses.
Depois, volvidos esses dois de velório, no dia 10, as urnas dos Mártires Reais são depositadas no Panteão Real da Igreja de São Vicente ou Panteão dos Bragança.
Só conheceriam a derradeira morada quando em 1933, após 25 de exposição, através de uma subscrição privada seriam inumados, nesse mesmo local e lugar, em dois sublimes túmulos prestando-Lhes a devida dignidade e a merecida a homenagem.
Paz às Suas Almas!

Miguel Villas-Boas

quinta-feira, 22 de fevereiro de 2018

Portugal, Nação de vocação Atlântica e marítima

Foto de Nova Portugalidade.



Portugal faz parte da Europa quer pela geografia quer pela partilha do substrato cultural comum ao continente, como é natural, e muitas outras semelhanças se poderiam enumerar. Portugal foi por diversas ocasiões tido em conta como potência europeia de primeira linha, tal como nos reinados de D. Manuel I ou de D. João V, altura em que os nossos embaixadores se sentavam à mesa com os agentes de outras nações em pé de igualdade. Ainda assim, os Reis que optaram por não entrar nos conflitos europeus e manter-se afastados das intrigas do centro do continente, concentrando antes as forças na Expansão, foram também os que gozaram uma maior prosperidade e esplendor. Tal explica-se com a simples razão de esses mesmos Reis terem conseguido compreender que uma estratégia inteligente de prosperidade para Portugal jamais passaria por uma política voltada para a Europa, mas sim para o Atlântico e para o mar. Nem poderia ser de outra forma; entalado entre a Espanha e o oceano, nas franjas do continente, só restava ao país aventurar-se pelas águas e expandir-se para o resto do globo, onde teria terreno para se implantar e expandir.

Sempre que se tentou o contrário, ou seja, concentrar as atenções na Europa, o resultado foi desastroso: dêem-se os exemplos de D. Fernando I ou de D. Afonso V, cujas guerras contra Castela redundaram em fracasso, ou, como supremo paradigma, os políticos liberais do século XIX, que, negando a essência do país (nesta altura já implantado pelo mundo) que governavam, tentaram suprimir a identidade deste através da “europeização”, implantando uma pura imitação dos modelos importados que passaram a dominar a vida nacional. Claro que o resultado foi o completo apagamento de Portugal no palco internacional e a queda num estado de decadência e mediocridade predominantes tanto no Portugal europeu como no Portugal asiático e africano, expressos através de um péssimo desempenho da economia e da falha geral das funções do Estado. O século XIX foi dirigido por políticos predominantemente anti-portugueses, o que só poderia resultar em desastre: se um país tentar ser o que não é, obliterando a sua essência, como é que lá chega? Não chega, e entrega-se à morte.

Estranha e sombria é, portanto, a política estratégica do regime de 25 de Abril, que, cometendo precisamente o mesmo erro fatal, decidiu apostar de novo na “europeização”, que mais não fez do que destruir a estrutura produtiva do país e apagar a sua relevância e soberania. Hoje, mais não somos do que vassalos de Bruxelas. É este o destino dos descendentes dos Reis de outrora? Como é que a História pode ser honrada assim?

Os restantes países da Portugalidade, por sua vez, também experimentaram o mesmo processo sofrido por Portugal: o Brasil tentou, a todo o custo, imitar os Estados Unidos da América, negando a sua ligação à terra-mãe onde nasceu, e o resultado está à vista de todos: falhou completamente na sua vendeta contra Portugal ao tentar imitar algo estranho à sua essência. Angola, Moçambique, e outros restantes, também se perderam de si próprios e vagueiam numa indefinição e letargia que os impede de atingir o seu potencial. Só há uma solução para estes problemas: a união de todas estas terras que partilham uma identidade, uma civilização e uma língua. Só quando todos compreenderem que devem regressar à essência primordial da Portugalidade, de Fraternidade e Amizade, partilhando a unicidade que está no âmago de todos eles, é que, finalmente, o esplendor poderá ser de novo vivenciado e celebrado. Resume-se, em suma, a cumprir a verticalidade da essência portuguesa, no sentido de estarmos alinhados com a nossa verdadeira identidade, esquecendo falsas ilusões a respeito de nós mesmos. Só a União faz a força.

Portugal faz parte da Europa em termos formais, mas em termos espirituais o seu coração está no mar e nos países do Atlântico e dos outros oceanos. Não é na Europa que a solução poderá ser encontrada. Isto não implica que não haja diálogo e colaboração com as nações europeias, mas o cerne da política externa só pode estar na Portugalidade por esse mundo fora, e não num continente do qual sempre fomos diferentes. Está na altura de assumir essa verdadeira identidade.

Miguel Martins

quarta-feira, 21 de fevereiro de 2018

Cardeal Zen “Sim, absolutamente, o Vaticano está vendendo a Igreja Católica na China”

“O governo comunista está produzindo novas e mais estritas regulações que restringem a liberdade religiosa. A partir de 1º de fevereiro de 2018, a reunião na missa da comunidade clandestina (fiel a Roma) não será mais tolerada. Há quem diga que todos os esforços para conseguir um acordo entre a China e a Santa Sé visam evitar um cisma eclesial. Isso é ridículo!
O Card. Joseph Zen, arcebispo emérito de Hong Kong, divulgou em carta de 29 de janeiro (2018) publicada por AsiaNews esclarecimentos sobre os dramáticos e inacreditáveis desdobramentos da conjunção da política vaticana com a repressão religiosa comunista na China.
Ele fez notar em primeiro lugar que os representantes vaticanos querem obrigar a bispos legítimos a entregar suas dioceses a bispos ilegítimos, um deles excomungado, todos eles bonecos do Partido Comunista.
O Cardeal escreveu: “reconheço que eu sou pessimista sobre a situação atual da Igreja na China, mas meu pessimismo se baseia na minha longa e direta experiência da Igreja na China.
“Tenho uma experiência direta da escravidão e humilhação a que estão submetidos nossos irmãos bispos. De acordo com a informação recente, não há razão para mudar essa visão pessimista.
O governo comunista está produzindo novas e mais estritas regulações que restringem a liberdade religiosa. A partir de 1º de fevereiro de 2018, a reunião na missa da comunidade clandestina (fiel a Roma) não será mais tolerada.
“Há quem diz que todos os esforços para conseguir um acordo entre a China e a Santa Sé visam evitar um cisma eclesial. Isso é ridículo!
O cisma já está ali com a Igreja independente [N.T.: de Roma, mas escrava do Partido Comunista].
“Os Papas evitaram usar palavra ‘cisma’ porque sabiam que muitos não estavam na comunidade oficial por livre e espontânea vontade, mas sob forte pressão.
“A proposta de ‘unificação’ forçará a qualquer um [para ingressar] nessa comunidade.
O Vaticano daria a bênção a uma nova Igreja cismática reforçada, lavando a má consciência daqueles voluntariamente renegados e outros que estão prontos para se unir a eles”.
Num outro ponto, o Cardeal Zen responde ao sofisma de que é bom encontrar um terreno comum para saldar a separação entre o Vaticano e a China.
E responde: “pode haver algo ‘comum’ com um regime totalitário? Ou você se rende ou aceita a perseguição. No ultimo caso você permanece fiel a você mesmo.
Pode-se imaginar um acordo entre São José e o Rei Herodes?
Abordando a pergunta crítica “acredita que o Vaticano está vendendo a Igreja Católica na China?”, responde:
“Sim, absolutamente, estão indo na direção que ficou obvia em tudo o que fizeram nos últimos meses e anos”.
Por fim, à pergunta: “És o maior obstáculo para o processo de acordo entre o Vaticano e a China?” respondeu: “Si esse acordo é ruim, estou mais do que feliz sendo um obstáculo”.
A sala de imprensa da Santa Sé reagiu em ação fora do comum, tentando desmentir as acusações do Cardeal Zen, o principal clérigo da China, segundo as quais o Vaticano estava “vendendo” os católicos chineses para agradar a Pequim, escreveu o Instituto Humanitas Unisinos reproduzindo matéria do britânico “The Tablet” de 30-01-2018.
Segundo o Cardeal chinês, o Papa Francisco lhe disse em audiência particular que não queria a “criação de outro caso Mindszenty”. 
O cardeal húngaro Jozef Mindszenty buscou asilo na representação dos EUA em Budapeste, em franca oposição ao governo comunista.
Por pressão do governo comunista, a Santa Sé impôs que ele saísse do país em 1971, e lhe tirou o título de primaz da Hungria.
Durante o papado de Paulo VI, o Vaticano adotou uma política de Ostpolitik, fazendo acordos com governos satélites da Rússia soviética convocando os católicos a coexistir com o regime inimigo da Igreja.
Nada na declaração vaticana nega que se tenha chegado a um acordo entre representantes do Vaticano na China e o governo de Pequim sobre a espúria imposição a bispos católicos para entregarem suas dioceses a bispos ilegítimos pro-comunistas.
O comunismo chinês quer nomear os bispos da China e o Vaticano estaria disposto a aceitar a imposição consagrando de fato a falsa igreja controlada pelo Estado, apelidada Associação Patriótica Católica Chinesa.
O cardeal Zen tem se pronunciado em nome dos católicos clandestinos – leais a Roma – que sofrem perseguição religiosa.
Fonte: IPCO

O “PAPA DITADOR” E OS CARDEAIS BURKE, BRANDMÜLLER E MÜLLER



O Papa ignorou uma petição de 870 mil assinaturas e não respondeu a uma carta assinada por mais de 50 estudiosos de nível internacional
Nas últimas semanas houve três entrevistas a alguns eminentes Cardeais. A primeira foi concedida em 28 de Outubro de 2017 pelo Cardeal Walter Brandmüller a Christian Geyer e Hannes Hintermeier, do Frankfurter Allgemeine Zeitung. A segunda foi dada em 14 de Novembro pelo Cardeal Raymond Leo Burke a Edward Pentin, do National Catholic Register. E a terceira, do Cardeal Gerhard Müller ao jornalista Massimo Franco, apareceu em 26 de Novembro nas colunas do Corriere della Sera.
O Cardeal Brandmüller manifestou a sua preocupação pela possibilidade de se abrir uma divisão na Igreja. «Levanta questões o simples facto de permanecer sem resposta uma petição com 870.000 assinaturas dirigidas ao Papa para lhe solicitar esclarecimentos e o facto de continuar sem responder a 50 estudiosos de nível internacional. É francamente difícil de entender.Apresentar “dubia” ao Papa, pedindo-lhe que esclareça questões duvidosas, foi sempre uma forma absolutamente normal de dissipar as ambiguidades. Simplificando, a questão é a seguinte: o que ontem era pecado pode hoje ser bom? Pergunta-se, por outro lado, se existem realmente actos – como sempre foi na doutrina constante da Igreja – que são sempre moralmente reprováveis em todas as circunstâncias? Como, por exemplo, o assassinato do inocente ou o adultério? Esta é a questão. Caso, de facto, se devesse responder à primeira pergunta com um ‘sim’ e com um ‘não’ à segunda, isso seria realmente uma heresia e, portanto, um cisma, uma divisão na Igreja.»

Há um perigo de cisma na Igreja e a responsabilidade disso cabe ao “círculo mágico” do Papa, que impede um debate aberto sobre os problemas doutrinários levantados pela “Amoris Laetitia”
O cardeal Burke, que declarou estar sempre em comunicação com o cardeal Brandmüller, formulou um novo alerta «sobre a gravidade de uma situação que nunca cessa de piorar» e reafirmou a necessidade de que todas as passagens heterodoxas da Amoris Laetitia sejam esclarecidas. Assistimos de facto a um processo que constitui «uma subversão das partes essenciais da Tradição. Para além do debate sobre a moral, está cada vez mais erodido na Igreja o sentido da prática sacramental, especialmente no que diz respeito à Penitência e à Eucaristia.»
O Cardeal dirige-se novamente ao Papa Francisco e a toda a Igreja, frisando «quão urgente é que o Papa, exercendo o ministério que recebeu do Senhor, possa confirmar os seus irmãos na fé, exprimindo claramente o ensinamento sobre a moral cristã e o significado da prática sacramental da Igreja».
O cardeal Müller, por sua vez, afirma existir o perigo de um cisma dentro da Igreja e diz que a responsabilidade da divisão não é dos Cardeais das dubia sobre a Amoris laetitia nem dos signatários da Correctio filialis ao Papa Francisco, mas do “círculo mágico” do Papa, que impede um debate aberto e equilibrado sobre os problemas doutrinários levantados por essas críticas:

Agora os católicos (e os não-católicos) são classificados conforme forem considerados “amigos” ou “inimigos” do Papa
«Atenção: se a Cúria Romana der a entender que se cometeu uma injustiça, poderia desencadear-se, quase por inércia, uma dinâmica cismática da qual seria depois difícil sair. Creio que seria importante escutar os Cardeais que expressaram as suas dúvidas sobre a Amoris Laetitia ou mesmo os 62 signatários de uma carta com críticas até excessivas ao Papa, em vez de qualificá-los de fariseus ou revoltosos. A única maneira de sair desta situação é um diálogo claro e franco. Pelo contrário, tenho a impressão de que no “círculo mágico” do Papa há quem se preocupe, acima de tudo, em espiar os seus presumíveis adversários, impedindo assim uma discussão aberta e equilibrada. O dano mais grave que eles causam à Igreja é o de classificar todos os católicos de acordo com as categorias “amigo” ou “inimigo” do Papa. Causa perplexidade que um conhecido jornalista ateu [Eugenio Scalfari, fundador do La Repubblicase gabe de ser amigo do Papa. E, inversamente, que um bispo e um cardeal católico como eu seja difamado e qualificado como adversário do Santo Padre. Não acho que essas pessoas possam dar-me lições de teologia sobre o primado do Romano Pontífice».

Tal como nos regimes comunistas, a denúncia anónima conquistou no Vaticano um poder decisivo nas destituições
Segundo o seu entrevistador, o cardeal Müller ainda não se recuperou do trauma causado pela exoneração de três dos seus colaboradores, exactamente antes de lhe ter sido negada a recondução ao cargo de Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, no passado mês de Junho. «Eram bons e competentes sacerdotes que trabalhavam para a Igreja com dedicação exemplar», segundo a sua opinião. «Não se pode destituir uma pessoa apenas por capricho, sem provas nem processo, só porque alguém denunciou anonimamente as suas vagas críticas ao Papa…».
«Qual é o regime em que as pessoas são tratadas desta maneira?», perguntou Damian Thompson em The Spectator no passado dia 17 de Julho.
E responde que a destituição dos colaboradores do Cardeal Müller «traz à mente alguns dos seus predecessores mais autoritários ou até mesmo algum ditador latino-americano que abraça as multidões e mostra um estilo de vida humilde enquanto os seus lugar-tenentes vivem no temor da sua cólera». Este aspecto do pontificado do Papa Francisco é agora tema de um livro que acaba de ser publicado com o significativo título O Papa ditador [“Il Papa Dittatore”]. O autor é um historiador formado em Oxford que se oculta sob o pseudónimo de “Marcantonio Colonna”. O estilo é sóbrio e documentado, e as acusações dirigidas ao papa Bergoglio são fundamentadas e abundantes.
Muitos dos elementos em que se baseia para formular as suas acusações já eram do conhecimento público. O que é novo é a acurada reconstrução de uma série de “quadros históricos”: [1] Os bastidores da eleição do Papa Bergoglio, dirigida pela “máfia de Saint Gallen”; [2] As andanças de Bergoglio na Argentina antes da sua eleição; [3] Os obstáculos encontrados pelo Cardeal Pell ao tentar fazer uma reforma financeira da Cúria; [4] As mudanças na Pontifícia Academia para a Vida; [5] A perseguição aos Franciscanos da Imaculada e a decapitação da Soberana Ordem Militar de Malta.

O medo é a nota dominante da Cúria sob a lei de Francisco
A comunicação social, sempre pronta a fustigar desdenhosamente qualquer caso de má governação e de corrupção, silencia-se diante desses escândalos. O principal mérito deste estudo histórico consiste em tê-los trazido à luz. «O medo é a nota dominante da Cúria sob a lei de Francisco, juntamente com a desconfiança mútua. Não se trata apenas de informadores que procuram vantagens relatando uma conversa privada, como constataram os três subordinados do Cardeal Müller. Numa organização onde as pessoas moralmente corruptas continuam a exercer os seus cargos e são até promovidas pelo Papa Francisco, há uma subtil chantagem na ordem do dia. Um sacerdote da Cúria ironizou assim: Costuma dizer-se que o importante não é o que sabes mas quem conheces. Assim é o Vaticano: O importante é o que sabes daqueles que conheces».
Em suma, o livro de Marcantonio Colonna confirma, aquilo que admite o Cardeal Müller na sua entrevista: a existência de um clima de espionagem e denúncia que o antigo Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé atribui a um “círculo mágico” que condiciona as decisões do Papa, enquanto o historiador de Oxford o imputa ao próprio modus gubernandi do Papa Francisco, que ele compara aos métodos autocráticos do ditador argentino Juan Domingo Perón, do qual o jovem Bergoglio era um partidário.
Poder-se-ia responder nihil sub sole novum (Eclesiastes 1:10). A Igreja teve muitos governos deficientes. Mas se este pontificado conduz realmente a uma divisão entre os fiéis, como sublinharam os três Cardeais, os motivos não podem limitar-se ao modo de governar de um Papa, mas devem ser procurados em algo absolutamente inédito na História da Igreja: o afastamento do Romano Pontífice da doutrina do Evangelho, que ele tem, por mandato divino, o dever de transmitir e guardar. Este é o cerne do problema religioso do nosso tempo.
Roberto de Mattei
Publicado por: Arautos d'El-Rei

terça-feira, 20 de fevereiro de 2018

Somos nacionalistas ? Claro que não, somos da Portugalidade

Foto de Nova Portugalidade.


O nacionalismo é coisa nova em Portugal; nova e tardia, inventada em finais do século XVIII e exportada pela Europa oitocentista por uma verdadeira "internacional nacionalista" - o "cosmopolitismo nacionalista" a que aludia Anne-Marie Thiesse na sua incontornável Criação das Identidades Nacionais - que fez estragos, dividiu o que era uno e juntou o que nunca estivera unido.

É hoje sabido que o nacionalismo nasceu da invenção de um passado mítico, socorrendo-se as mais das vezes de manipulação de fontes literárias, invenção de textos e, até, invenção de línguas anteriormente quase inexistentes. Tudo começou com Macpherson, que literalmente inventou o celtismo. Depois, foi a vez de Herder, de Goethe e dos irmãos Grimm criarem uma identidade alemã, jamais comprovada, a partir de colecções de lendas, delas retirando um "volkstum" e um "volksgeist" (um espírito popular) que indiciava uma "essência nacional". Ora, se perguntassem a Mozart se era alemão ou austríaco, este responderia que não era nem uma coisa nem outra. Considerar-se-ia, apenas, súbdito do arcebispo-príncipe de Salzburgo e, por extensão, súbdito dos Habsburgos.

Grande parte dos "nacionalismos" nasceram de colagens, recortes e importações literárias. O "nacionalismo" sérvio foi inventado por Prosper Mérimée na célebre La Guzla, o "nacionalismo helénico" saiu das antologias de Claude Fauriel e o mito de uma Roménia latina foi urdido pelos irmãos Shott a partir de contos valáquios. Depois, coube aos nórdicos desenterrarem sagas a partir da oralidade (a oralidade não resiste a duas ou três gerações), pretendendo recriar o volkstum viking, preenchendo um hiato de mil anos obscuros.

Este movimento que sacudiu a Europa ao longo de Oitocentos - o nacionalismo - serviu para a engenharia da fabricação dos Estados contemporâneos e teve como instrumento de difusão a imprensa (o periodismo), a fixação de "línguas nacionais" através de dicionários e gramáticas, bem como a rede de ensino primário. Pode-se dizer, com propriedade, que o nacionalismo é (e foi), nesta acepção, uma invenção; em suma, uma ideologia.

Lembrando o sábio Popper, o nacionalismo constitui a "secularização da superstição religiosa" em sociedades onde o sagrado e o religioso pedem novas ligações e devoções.

Contudo, se há identidade que prescindia desse esforço de estandardização forçada, esse era Portugal. Portugal não precisava de importar o que quer que fosse pois erigira, ao longo de séculos, uma identidade compacta e homogénea - uma consciência nacional - com provas dadas desde a revolução de 1383-85: uma só língua, uma só religião, contornos geográficos estabilizados no século XIII e, depois, um sentido de comunidade que se exportou e incorporou outros "portugueses" pela simples exigência da fidelidade ao Rei de Portugal e ao catolicismo.
O "nacionalismo postiço" europeu de Oitocentos fez estragos que mataram a identidade portuguesa. O liberalismo, ao inventar o cidadão, privou de "cidadania identitária" todos aqueles que se consideravam "portugueses" desde o século XVI. Depois, o estúpido Acto Colonial, separou os habitantes do ainda vasto império remanescente em "colonizadores" e "colonizados". O patriotismo português fora um alicerce da capacidade de resistência e unidade. O "nacionalismo português", aqui chegado no comboio de Paris, empobreceu, reduziu e matou.

Dizia-me há dias um amigo que o "nacionalismo" é o bilhete de identidade de uma sã consciência do grupo. Respondi-lhe que não: esse nacionalismo não é nosso, é uma ideologia, uma simplificação, uma impostura. O verdadeiro esteio da unidade dos "portugueses" está no patriotismo, o mesmo que venceu no passado e uniu, em vez de separar. Os cronistas holandeses que escreveram sobre os Guararapes indignaram-se pelo facto dos seus exércitos - brancos, louros e calvinistas - haverem sido destroçados por um exército de escravos negros, mestiços esfarrapados e brancos papistas. Da Europa nem sempre chega boa mercadoria. O "internacionalismo nacionalista" terá sido, sem dúvida, da pior contrafacção.

MCB