02 agosto 2015

Ceuta 1415 - 3. No melhor pano cai a nódoa

Enquanto a grande armada portuguesa estacionada em Faro aguarda a chegada do bom vento que a levará ao Estreito, avancemos 225 anos na História, até uma fria noite de inverno em Fevereiro de 1641.

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 Em Lisboa viviam-se momentos de grande felicidade pela libertação dos 60 anos de pesado jugo estrangeiro e pela aclamação do Duque de Bragança como Rei D. João IV, que ocorrera dois meses antes. Muito era também o cuidado posto na preparação da defesa do Reino, em face da certeza de um iminente ataque dos espanhóis. Utilizavam-se todas as comunicações e canais diplomáticos para assegurar que a aclamação se estendia rapidamente a todos os territórios portugueses de além-mar. A rapidez de actuação era decisiva.

Para bordo de um navio alemão estacionado no Tejo subiam, com as suas famílias e criados, Duarte Luís de Meneses - conde de Tarouca – e João Soares de Alarcão – alcaide-mor de Torres Vedras – os novos governadores de Tanger e de Ceuta, ainda nomeados pelo governo de Filipe IV. As nomeações tinham sido depois confirmadas por El-Rei D. João IV, a quem ambos beijaram as mãos e de quem receberam ordens de partida imediata para os seus novos postos. Estavam incumbidos da urgente missão de anunciar as boas novas do Reino e de assegurar a total adesão daquelas duas praças ao novo soberano português. Seguia o navio a caminho do Estreito quando, à vista de Cádis, os governadores exortaram o mestre do navio a entrar naquele porto, a fim de poderem observar de perto a armada castelhana. O alemão recusou, não querendo desviar-se da rota definida mas, pouco depois, com a ajuda dos criados a bordo, obrigaram-no pela força a arribar a Gibraltar. Saltando para terra, seguiram imediatamente com as famílias para Sevilha, onde se encontraram com outros fidalgos portugueses com quem tinham urdido todo o plano de fuga. Dali se dirigiram todos para Madrid e colocaram-se à disposição do rei habsburgo. Filipe IV agradeceu-lhes a lealdade e enviou imediatamente os meios necessários para procurar a todo o custo preservar a fidelidade daquelas praças. Tanger acabaria por aclamar D. João IV dois anos mais tarde mas Ceuta, condicionada pela presença de forte dispositivo espanhol, nunca chegou a poder faze-lo.

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 Ao cabo dos 28 longos e vitoriosos anos de Guerra da Restauração, Portugal conseguiu a formidável proeza de recuperar praticamente todas as suas posses ultramarinas, com excepção de uns poucos territórios asiáticos perdidos para os holandeses e de Ceuta que acabou por ser a única praça cedida a Espanha, conforme o tratado de paz de Lisboa, assinado a 13 de Fevereiro de 1668. Mas nem por isso se apagou nesta cidade a memória daqueles que derramaram o sangue na sua conquista e na sua preservação, como bem o testemunham as armas de Portugal em fundo de Lisboa, ainda hoje os símbolos presentes no estandarte oficial da cidade autónoma de Ceuta.

É sabido que não foram estes os únicos infelizes membros da nobreza de Portugal que naquela ocasião optaram por passar a Espanha. Mas a traição do conde de Tarouca foi particularmente ignóbil, dado que o mesmo descendia, por varonia, de valorosos militares portugueses combatentes em África: Destacam-se D. Duarte de Meneses - conde de Viana e primeiro capitão de Alcácer Ceguer - herói que deu a sua própria vida para proteger El-Rei D. Afonso V; e o seu pai D. Pedro de Meneses - conde de Vila Real e primeiro capitão de Ceuta - que integrava a armada da expedição de 1415 e de quem adiante voltaremos a falar. Foi no melhor pano que caiu a nódoa.

João Ferreira do Amaral, em 01.08.15

Fonte: 31 da Armada

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